24 fevereiro 2007

A «MENSAGEM» DE FERNANDO PESSOA

A Mensagem de F. Pessoa é um livro curioso. O autor assume-se aí como uma espécie de profeta que, embora a posteriori, vai desvendar o sentido da história nacional; um sentido inimaginável, oculto ao olhar comum e que aponta o futuro como algo grandioso. O livro parece produto de mais um heterónimo pessoano, tal é a distância a que se situa quer da poesia do ortónimo quer da dos três heterónimos mais conhecidos (quanto a temática – caso do pouco ortodoxo Cristianismo – e mesmo estilo). Os seus poemas – que assentam numa leitura gratuita, mistificadora da vida de figuras notáveis da nossa história – são de grande qualidade poética.
Benedictus Dominus Deus noster qui dedit nobis signum: «Bendito seja o Senhor, nosso Deus, que nos deu um sinal (uma mensagem)!», começa o poeta. E é sem dúvida a ele que cabe revelar os indícios desse sinal que Deus disseminou ao longo do passado do país.
A chave principal de que se socorre é o sebastianismo, que vem de mistura com outras influências de carácter ocultista.
A Mensagem organiza-se em três momentos, Brasão, Mar Português e Encoberto, abrindo cada um deles com uma breve expressão latina:
Bellum sine bello (Guerra sem guerra); Possessio maris (Posse do mar) e Pax in Excelsis (Paz nas alturas)[1].
É bem original a leitura que Pessoa faz do Brasão português: campos heráldicos, castelos, quinas, grifo, tudo ele representa como figuras históricas que em si encarnaram por um momento e com uma missão concreta esse sinal que aponta o futuro.
Mar Português, a segunda parte, é uma sucessão mais linear de temas da nossa aventura marítima, mas cabem lá também o Mostrengo (um sucedâneo do Adamastor), Horizonte, Ocidente, Mar Português, e ainda poemas mais esotéricos como Ascensão de Vasco da Gama ou a Prece final.
A revelação da Mensagem atinge o seu cume na terceira parte, O Encoberto, a que o poeta impôs uma divisão tripartida de Os Símbolos, Os Avisos e Os Tempos, tudo em função da vinda de D. Sebastião e do seu Quinto Império. A obra culmina com o poema intitulado Nevoeiro, aquele nevoeiro que antecederá a chegada do Desejado. Este momento é precedido por uma sucessão de poemas ordenados em aproximação gradativa à hierofania que há-de garantir sentido a todo o livro: Noite, Tormenta, Calma, Antemanhã e, por fim, Nevoeiro.
«É hora!» avisa o vate antes de se despedir, o que faz em latim: Valete, Fratres (Adeus, Irmãos!)

Por muito que se queira valorizar esta mistificação pessoana, fica-se no fim bastante desarmado e ocorrem à nossa memória os versos irónicos do poema Liberdade, que tudo dissolvem em jogo:

Quanto é melhor, quando há bruma,
Esperar por D. Sebastião,
Quer venha ou não!

Tanto investimento poético para isto?

[1] A frase de abertura parece ter origem na versão latina do Cântico de Zacarias, ou Benedictus, que se lê no Evangelho de S. Lucas, 1, 67 e ss. No mesmo Evangelho encontra-se também a sugestão de Pax in Excelsis, no canto dos Anjos depois do anúncio aos pastores. Mas há uma inversão face ao texto de origem: lá a paz era anunciada aos homens e a glória, essa é que era «nas alturas».

16 fevereiro 2007

A ESQUERDA EM TODA A SUA TREVA

«Aconselhamento, não!» Portanto, feche os olhos e mate.
É a Esquerda em toda a sua treva.
Veja o leitor esta prosa de «O fim de uma longa farsa»: http://www.olavodecarvalho.org/semana/070201jb.html

14 fevereiro 2007

AI FLORES, AI FLORES DO VERDE PINHO - "A LO DIVINO"

Desde há anos que eu noto que a cantiga Ai flores, ai flores do verde pinho, atribuída a D. Dinis, mas certamente muito anterior a ele, podia suportar uma leitura «a lo divino».
Esta expressão espanhola significou originalmente a imitação, em registo religioso, de um tema poético popular. No presente caso, tratar-se-ia apenas duma interpretação, duma leitura pascal: «o meu amigo» seria Jesus morto e ressuscitado. E a Páscoa diz Primavera, flores.
Parece que destoa aquele «mentiu», mas pode-se interpretar como referindo a terrível desilusão causada pela morte ignominiosa do Mestre, que os seus amigos não entendiam. «Ai Deus, e u é?", perguntar-se-iam eles, desorientados.
Mais difícil de encaixar ainda seria a invocação das «flores do verde pino»; mas quem exigiria tal rigor teológico a esta cantiga «primitiva»?
Veja o leitor:

- Ai flores, ai flores do verde pinho,
Se sabedes novas do meu amigo?
Ai Deus, e u é?

Ai flores, ai flores do verde ramo,
Se sabedes novas do meu amado?
Ai Deus, e u é?

Se sabedes novas do meu amigo,
Aquel que mentiu do que pôs comigo?
Ai Deus, e u é?

Se sabedes novas do meu amado,
Aquel que mentiu do que me há jurado?
Ai Deus, e u é?

- Vós me preguntades polo vosso amigo,
E eu bem vos digo que é san'e vivo.
Ai Deus, e u é?

Vós me preguntades polo vosso amado,
E eu bem vos digo que é viv'e sano.
Ai Deus, e u é?

E eu bem vos digo que é san'e vivo
E ser vosc'ant'o prazo saído.
Ai Deus, e u é?

E eu bem vos digo que é viv'e sano
E ser vosc'ant'o prazo passado.
Ai Deus, e u é?

12 fevereiro 2007

REIVINDICAÇÃO

A Esquerda, que se apropriou do 25 de Abril, anda a fazer uma lavagem ao cérebro das pessoas. E as pessoas acham graça, pois ela diz-lhe o que elas querem ouvir.
Até já aceitam que as mães matem os seus filhos!
Como professor de Português do Secundário, creio que é notória nos programas a falta de pluralidade ideológica de propostas de leitura! É uma e mesma continuada cartilha.
Para o que não quer encaixar-se, faz-se uma selecção ajustável ao modelo ou imagina-se um interpretação apropriada.
Perante isto, é indispensável uma postura muito crítica para denunciar o que não presta, para exigir uma visão mais ampla e plural do fenómeno literário. É preciso dizer que não presta ao que não tem préstimo. E há tanta coisa que não presta!
Uma consequência disto são os maus-tratos que recebe o patriotismo, hoje reduzido ao fanatismo futebolístico. Querendo ajustar tudo ao modelo esquerdista sem raízes no nosso passado, que fica dele? A sua ridicularização continuada.