07 março 2007

DERAM-LHE TANTAS TALEIGADAS QUE ELE MORREU

Estamos em 1837 numa freguesia barcelense. Melhor, em duas, como se vai ver.
O reitor Afonso e Abreu foi por qualquer razão a uma freguesia vizinha e lá deram-lhe tantas taleigadas que pouco adiante morreu.
O que se sabe da sua vida é pouco. Mas sabe-se que foi um liberal ferrenho, ao contrário de quase todos os outros párocos da sua vizinhança.
Disso não se pode concluir que ele fosse pior nem melhor que os seus colegas; os documentos não no-lo dizem. Mas contam outras coisas.
Quando, em 1826, foi preciso jurar a Carta Constitucional, ele foi muito afoito na aceitação. Onde todos iam apor timidamente a assinatura, por ter que ser, ele jurou individualmente, «voluntariamente», como fez questão de registar (ver na imagem). A sua atitude valeu-lhe depois a prisão.
Quando os liberais chegaram ao poder, conseguiu, não se sabe bem por que artes, a anexação duma freguesia vizinha, cujo pároco foi expulso.
Mas os anos passaram e a morte veio ao seu encontro: uma morte violenta cujas razões não estão explicadas.
O pároco expulso, que acabará por retomar o seu lugar, era um homem meticuloso, cumpridor, obediente à autoridade eclesiástica, com cujas determinações se identificava. Mas da humilhação não se livrou, como aliás muitos outros.
Se alguns tinham suspirado pela revolução liberal, a maior parte só a associava aos piores momentos do Terror da sua antepassada francesa. Se porém não se chegou a tais extremos, ela trouxe gravíssimas humilhações à Igreja. Basta lembrar o cisma de dez anos então gerado e a extinção das Ordens Religiosas: um verdadeiro cataclismo.
Onde nos leva isto? Ao simplismo com que hoje se lida com estas situações. Colocam-se de um lado os bons – isto é, os vencedores – com quem as pessoas se julgam identificadas, e do outro os maus, os vencidos, com quem ninguém quer alinhar.
Bem se sabe que a história esquematiza, mas, porque se sabe, há que estar em defesa face a esses primarismos.

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